De Cthulhu à Clonagem

por Jason Colavito, original em Lost Civilizations Uncovered

Um exame crítico do papel que o mito Cthulhu de Lovecraft desempenhou em armar o cenário para a hipótese de deuses astronautas com uma ênfase nas conexões entre autores "alternativos".

INTRODUÇÃO
 
O conceito de extraterrestres disfarçados como deidades existiu de uma forma ou de outra ao longo do todo século 20 e já adentra o 21. Como apenas um de um punhado de mitos modernos capaz de gerar um fluxo enorme de dinheiro nas mãos de seus proponentes (um dos outros sendo o mito OVNI relacionado), esta lenda cresceu exponencialmente para abranger uma gama extensa de crenças pseudo-científicas e fantásticas . Estas tentativas mal-direcionadas de explicar o passado antigo em condições futurísticas têm conseqüências diretas para a vida moderna. 

PRECURSORES DO MITO

O final do século 19 estava repleto de contos fantásticos de romance científico, como H.G. Wells os chamava. O mundo estava na agonia da revolução industrial e os avanços notáveis em tecnologia que a acompanhavam. Para aqueles vivendo nessa época, parecia que um mundo ilimitado de avanço científico havia sido aberto à sua frente. 

Graças à teoria da evolução de Charles Darwin, o materialismo científico se tornou a religião de facto e não oficial da inteligentsia, e a religião organizada se tornou um método primitivo e antiquado de observar e entender o mundo. Por conseguinte os arquétipos da religião precisaram de uma saída nova para permanecerem atuais. Esta mudança no pensamento religioso se tornaria um componente fundamental na teoria de deuses astronautas. 

Foi nessa época que os primeiros relatos fictícios de extraterrestres emergiram nos trabalhos como a Guerra de Mundos de Wells. Ao mesmo tempo, o erro de tradução de Percival Lowell dos canali italianos e a qualidade pobre das imagens de canais não-existentes em Marte tinham convencido o mundo que uma civilização marciana não era só ficção mas uma realidade científica. Mais ou menos neste tempo, o objeto misterioso parecido com um aeróstato visto sobre os EUA e chamado o Grande Mistério do Aeróstato fez muitas pessoas acreditarem que os marcianos possuíam aeróstatos capazes de invadir a Terra. Esta vontade de acreditar faria um século depoisos deuses astronautas mais que apenas uma teoria. 

Nos anos vinte, aliens começaram a ocupar seu espaço na cultura mainstream por exposição na nova mídia que era o filme. Uma adaptação de Da Terra à Lua de Júlio Verne se tornou um dos primeiros filmes a caracterizar extraterrestres. Muitos espectadores ingênuos acreditaram que os aliens eram reais porque não podiam compreender os conceitos por detrás de uma mudança tão radical no entretenimento como o filme. Esta credulidade inerente das massas também faria sua parte no mito de deuses astronautas. 

ORIGENS DO MITO

No fim dos anos vinte um autor obscuro chamado Howard Phillips Lovecraft começou a publicar em revistas populares uma série de histórias; estórias que a ficariam registradas como o Mito Cthulhu [NdoT: lê-se ku-thul-rru]. Estes contos se centravam em um grupo de entidades transdimensionais e extraterrestres que serviram como deidades ao homem primitivo. Lovecraft escreveu que Cthulhu e os Grandes Antigos, como ele (às vezes) chamou os deuses alienígenas, vieram de estrelas escuras. Alguns viveram em um planeta que ele chamou de Yuggoth e identificou nos anos trinta com o planeta recentemente encontrado, Plutão. 

Em "O Chamado de Cthulhu" [Call of Cthulhu], Lovecraft dispôs os fundamentos de seu conceito mitológico. Ele disse que muitos milênios atrás, os Antigos vieram de outros planetas e estabeleceram residência na Terra. Quando as estrelas estavam erradas eles não podiam viver, assim eles desapareceram sob o oceano ou voltaram aos seus mundos de origem onde usaram poderes telepáticos para comunicar-se com o Homem. Central ao mito de Lovecraft, os Antigos formaram um culto e uma religião que adorava os aliens como deuses. Nas histórias, os Antigos pairam a meio caminho entre puros extraterrestres e verdadeiros deuses, como requer o enredo. Em seu romance Nas Montanhas da Loucura [At the Mountains of Madness], ele escreveu que uma espécie dos Antigos criou o homem para servi-los, iniciando as primeiras civilizações humanas: Atlântida, Lemuria e Mu. 

Lovecraft usou as mitologias suméria, egípcia e grega como base para os seus semideuses monstruosos. Ele disse que seu deus-mensageiro Nyarlathotep era um membro do panteão egípcio. Ele identificou o peixe-deus fenício Dagon (anteriormente Oannes) como o próprio Grande Cthulhu, e assim se tornou a primeira pessoa a ligar extraterrestres a religiões antigas. Entretanto Lovecraft nunca alegou que suas histórias eram qualquer coisa além de ficção. 

No oposto extremo, outro escritor de ficção científica, L. Ron Hubbard, começou a brincar com o tema de extraterrestres como protagonistas em uma batalha cósmica. Hubbard flertou brevemente com o Satanismo sob a orientação do já idoso Aleister Crowley, mas decidiu forjar sua própria crença religiosa idiossincrática. Pela metade do século ele estava a caminho de fundar a Cientologia, construída na premissa de que aliens entraram em uma batalha cósmica um milhão de anos atrás e os perdedores caíram na Terra onde eles modificaram geneticamente o Homo erectus para carregar seus genes. Não há nenhuma evidência direta de que Hubbard leu Lovecraft, mas já que ambos os homens escreveram ficção científica para revistas populares nos anos trinta, é improvável que Hubbard desconhecesse os trabalhos de seus rivais. Na realidade, já que Hubbard freqüentemente era alvo de suspeitas de roubar ou apropriar-se de idéias alheias como suas (ver Bare-Faced Messiah de Russel Miller), esta identificação com o mito de Cthulhu não está fora de cogitação. Hubbard tornou-se amigo de L. Sprague De Camp, um protegido de Lovecraft, e os dois passariam freqüentemente noites inteiras compartilhando histórias. Indubitavelmente, algumas delas devem ter se relacionado com o mentor de De Camp, Lovecraft. De qualquer modo, Lovecraft e Hubbard criaram religiões baseadas em extraterrestres. Foi apenas Hubbard que alegou que a sua era real. 

Ao mesmo tempo, o mito OVNI moderno se desenvolveu das tentativas de Hollywood para filmar histórias de ficção científica sobre extraterrestres. As lendas mais famosas são o alegado acidente de OVNI em Roswell, Novo México em 1947 e a abdução de Betty e Barney Hill nos anos sessenta. O governo explicou o evento de Roswell como um balão meteorológico caído, mas essa resposta não ressonou bem com os crentes que insistiram que o folclore local sobre alienígenas mortos era verdade. Quando a história de abdução dos Hill entrou em pauta por sua semelhança com o filme Invasores de Marte e um episódio de Quinta Dimensão veiculado apenas alguns dias antes, verdadeiros crentes acharam modos de contornar o peso da evidência e umas série de novas abduções apareceu. Com o
público desconfiando de explicações oficiais e preparado para aceitar a realidade de extraterrestres, o sucesso da hipótese de deuses astronautas estava garantido antes mesmo que ela fosse redigida. 

Eram os Deuses Astronautas?

Nos anos cinqüenta o pseudocientista russo Immanuel Velikovsky avançou sua teoria de catastrofismo periódico em uma série de livros, o mais famoso dos quais era Mundos em Colisão. Ele postulou que o cinturão de asteróides veio de um planeta explodido, e disse que Vênus era um cometa ou asteróide que passou perto da Terra causando inundações. Ele disse que mitos antigos de fogos no céu relacionavam-se à passagem de Vênus. Para fazer esta reivindicação, mitos precisavam ser lidos literalmente com um olho tecnológico. Em seu zelo para provar sua refutação do uniformitarianismo, Velikovsky forneceu a ligação final entre extraterrestres e o homem antigo. Pela primeira vez histórias antigas de deuses e monstros se tornaram histórias literais. 

No outro lado do mundo o professor Charles Hapgood seu Caminho do Pólo [Path of the Pole] (1958: originalmente Earth’s Shifting Crust) e Mapas dos Antigos Reis dos Mares [Maps of the Ancient Sea-King] (1966), no qual ele argumentava que mapas antigos mostram claramente a influência de uma civilização pré-Era Glacial capaz de mapear o mundo. No primeiro livro Hapgood defendeu que a crosta terrestre desliza em um pedaço, como uma casca de laranja solta, destruindo a civilização a cada 20.000 anos aproximadamente. Este pensamento deriva do movimento de catastrofismo ressurgente de Velikovsky dos anos cinqüenta. No segundo livro, Hapgood reconstrói mapas enigmáticos para provar que os antigos possuíam um conhecimento detalhado de geografia. Suas reconstruções se assentavam na suposição de que os mapas originais, que serviram de fonte da qual os antigos traçaram os seus mapas, eram perfeitos e seguiam projeções modernas. Conseqüentemente, ele estava destinado a concluir que os mapas de fonte eram perfeitos, já que esse era o conceito original. O trabalho dele prosseguiria para influenciar grandemente o pai da teoria de deuses astronautas, Erich von Däniken

Em 1968 von Däniken publicou seu magnum opus, Eram os Deuses Astronautas? no qual ele postulou que os trabalhos antigos do homem, das pirâmides de Egito às enigmáticas linhas de Nazca, eram o trabalho de extraterrestres que vieram à Terra e deram civilização ao gênero humano. O livro rapidamente vendeu milhões de cópias, gerando milhões de seguidores leais e se ramificando em uma adaptação cinematográfica de Rod Serling, Eram os Deuses Astronautas?

Não há nenhuma evidência direta de que von Däniken leu Lovecraft ou seguiu Hubbard, mas é duvidoso que um homem jovem obcecado com o fantástico poderia ter sido ignorante do mito de Lovecraft, mesmo que por um relato de segunda-mão. Nos anos sessenta, Cthulhu e seus minions haviam entrado, até mesmo tangencialmente, em centenas de histórias e romances do estranho e fantástico porque Lovecraft, que morreu em 1936, havia encorajado seus fãs a usar as suas criaturas fictícias em suas próprias histórias. Isto foi feito para dar um ar de verossimilhança aos contos. Durante os anos sessenta muitas pessoas foram à procura dos deuses de Lovecraft, acreditando que eram reais. Até mesmo se von Däniken nunca leu "Chamado de Cthulhu", a idéia estava em voga. 

Von Däniken admitiu a dívida que ele tinha com Hapgood e Velikovsky livremente. Os livros dele são atados com referências liberais aos trabalhos deles. Von Däniken teve bastante tempo para ler Velikovsky e Hapgood porque estava na prisão. Von Däniken disse que escreveu Eram os Deuses Astronautas? Enquanto trabalhava como um aprendiz de hotel com 19 anos (ele nunca terminou a escola). Isto colocaria o livro dele em 1954, contudo o livro não foi publicado até 1968, o mesmo ano em que seu encarceramento terminou. Apesar das sugestões dele em Eram os Deuses Astronautas que sua prisão foi levada a cabo pela oposição às suas teorias radicais, registros suíços mostram que ele foi preso aparentemente por desfalque, depois de ter gasto 40.000 francos suíços que pertenciam ao hotel dele para pagar uma viagem ao redor do mundo. Ele alegaria depois que esta viagem era pesquisa para seu livro. Na realidade, o único modo de colocar Eram os Deuses Astronautas antes de Hapgood seria assumir que a excursão pelo mundo de von Däniken contou como escrever o livro dele. Mas uma vez que Hapgood e Velikovsky são mencionados em Eram os Deuses Astronautas, isto está obviamente errado. 

Von Däniken alegou que seu livro mudaria o mundo: "Até mesmo se um exército reacionário tentar represar esta inundação intelectual nova, um mundo novo deve ser conquistado à revelia de todos opositores em nome da verdade e realidade." Infelizmente, muito de Eram os Deuses Astronautas e suas seqüências imediatas Deuses do Espaço Exterior (1970) e Ouro dos Deuses (1972) é anedótico, desinformação ou simples invenção. No meio dos anos 90 von Däniken admitiu que parte do material de Eram os Deuses Astronautas original foi inventado, mas complementou que a fraude era necessária para vender a "verdade" aos incrédulos. Até hoje, crentes compraram milhões de cópias dos 25 livros dele, e muito poucos questionam a validez de seus argumentos. 

As muitas faltas e falhas de Eram os Deuses Astronautas e suas seqüências não detiveram a comunidade UFO e paranormal, buscando credibilidade avidamente, de adotar a visão de Däniken como a versão não oficial da história pela qual eles interpretariam eventos modernos. Em 1976, as teorias de von Daniken se ramificariam em duas direções conduzindo ultimamente ao mundo estranho da história alternativa e clonagem humana. Nesse ano Robert Temple publicou O Mistério de Sírio e Zecharia Sitchin publicou O Décimo segundo Planeta, cada um um grande marco na visão de mundo paranormal. 

O MISTÉRIO DE SÍRIO

Filip Coppens defende em seu website que o Mistério de Sírio de Temple é o mais importante dos dois trabalhos de 1976 porque o livro de Temple atingiu o status de um trabalho semi-científico. Nele, Temple alega que a tribo Dogon de África ocidental obteve conhecimento esotérico da natureza binária da estrela Sírio por contato com o Egito antigo. Ele prosseguiu para reivindicar que o Egito recebeu sua sabedoria sobre estrela dois-em-uma Sírio de alienígenas anfíbios daquele sistema estelar que vieram à Terra e fundaram uma civilização sob o disfarce do deus-criador sumério Oannes, conhecido na Bíblia como Dagon que nós vimos Lovecraft identificar como seu deus-alienígena Cthulhu. 

Temple construiu sobre a ciência corrente de então e relacionou seus resultados à dissertação científica Hamlet’s Mill de Georgio Santillana e Hertha von Deshund. Esse livro fez a alegação de que os antigos tinham um conhecimento muito sofisticado de astronomia que eles codificaram em seus mitos e religiões. Temple levou isto um passo mais adiante e atribuiu aquele conhecimento aos anfíbios moradores de Sírio. 

Em seu livro que no geral é fantasioso e não-confiável, A Conspiração Stargate [The Stargate Conspiracy], Lynn Pickett e Clive Prince descobriram que Temple recebeu grande influência de Arthur Young, seu mentor. Young era um crente nos Nove, um grupo de entidades psíquicas dos anos cinqüenta que se dizia representar os nov
e deuses-criadores do Egito antigo. Significativamente, estes Nove declararam (através de médiuns) que eram extraterrestres do sistema estelar Sírio. Young assistiu ao primeiro contato com os Nove em 1952, iniciado por Andrija Puharich que ficou famoso como o homem que trouxe o suposto paranormal entortador de colheres Uri Geller para a América nos anos setenta. Os Nove parecem muito influenciados pela quasi-mística Egiptologia-Satanista de Aleister Crowley que influenciou a Cientologia de Hubbard. Os Nove somaram uma dimensão extra aos OVNIs que estavam às voltas com o incidente Roswell. 

Pickett e Prince concluem que o Mistério de Sírio de Temple representa a tentativa de um homem jovem para agradar seu mentor, e eles descobriram que o conhecimento esotérico dos Dogon a respeito de Sírio foi fornecido pelos antropólogos que estudaram a tribo, Marcel Griaule e Germaine Dieterlen. O antropólogo Walter van Beek falou com os Dogon em 1991: "Todos concordam. . . que eles aprenderam sobre a estrela de Griaule." 

No entanto Temple deu uma adição sem igual à mitologia crescente sobre ancestrais cósmicos. Em O Mistério de Sírio Temple identifica cidades gregas e egípcias específicas com estrelas, e ele faz a afirmação extraordinária de que certos oráculos centrais Greco-egípcios, como o Oráculo de Delphi, formam um quadro gigantesco da constelação Argo. Pela primeira vez as estrelas tinham uma imagem na Terra. 

Esta interpretação única de construções antigas foi rapidamente notada por um ex-agrimensor e arqueólogo amador chamado Robert Bauval. Ele buscou aplicar os mapas estelares de Temple a construções egípcias antigas. Bauval notou uma semelhança entre o plano das três pirâmides de Gizé e as três estrelas do cinturão na constelação Orion. Quando ele usou os Textos da Pirâmide para identificar um com o outro, ele soube que tinha algo importante. Ele se associou com Adrian Gilbert para escrever O Mistério de Orion (1994). Gilbert era famoso por seu livro As Profecias Maias, onde ele usou o último dia do calendário maia, 23 de dezembro de 2012, como o dia do Armageddon em uma predição de destruição cósmica. 

A teoria de Bauval teve uma elegância simples que faltava às tentativas prévias de reescrever a história. O alinhamento pirâmide-estrela parecia lógico e convincente. Então Bauval levou isto um passo mais adiante e reivindicou (porque Hamlet’s Mill disse assim) que os egípcios entendiam os movimentos das estrelas com o passar do tempo, a precessão dos equinócios, que faz uma volta pelas estrelas ao redor do céu cada 25,800 anos. Portanto, as pirâmides devem estar alinhadas precisamente às estrelas. Bauval alegou que as pirâmides combinavam com as estrelas apenas em uma data: 10.500 AC. Logo, a civilização deve ter essa idade. 

Ao mesmo tempo o autor e jornalista britânico Graham Hancock chegou ao Egito para explorar o trabalho do guia de excursão John Anthony West e o geólogo aventureiro Robert Schoch que diziam ambos que a grande Esfinge datava ao redor de 10.500 AC com base em evidência de que a estátua tinha sido submetida à água da chuva. Hancock tinha se interessado por mistérios antigos como resultado da procura dele pela Arca da Aliança e o sucesso subseqüente do livro dele sobre o assunto, O Sinal e o Selo. Ele buscou mistérios novos para trazer aos seus leitores, e assim as maravilhas de Egito eram um lugar bom para começar. Hancock se encontrou com Bauval e os dois ficaram rapidamente amigos. Hancock publicou então o seu tomo volumoso Digitais dos Deuses [Fingerprints of the Gods] (1995) e escreveu uma seqüência, Mistério da Esfinge (1997) com Bauval. 

Nesses livros Hancock expôs sua teoria inspirada em Temple e Däniken de que as maravilhas antigas, como a megalítica Tihuanaco e as Pirâmides, eram o trabalho de uma civilização perdida que desapareceu com a Era Glacial. Hancock usou muito da mesma evidência que von Däniken mas dispensou os extraterrestres, encaixando sua lógica na mitografia de Hamlet’s Mill. Hancock defendeu que mudanças sutis nas estrelas eram a força motriz por trás de mitos antigos. Muito similar aos Antigos de Lovecraft para os quais quando as estrelas estavam erradas, eles não podiam viver, Hancock insinuou que o ciclo de precessão trouxe consigo o começo e o fim de civilizações. 

Como as fraudes do século 19 e começo do século 20 de Lemuria e Mu que Lovecraft emprestou para sua civilização antiga, Hancock viu o mundo perdido antigo como um de alta tecnologia e cultura. Entretanto quando ele e Robert Bauval escreveram O Mistério de Marte (1998), a visão deles havia mudado. Os autores reivindicam agora que a civilização perdida pode ter sido destruída por um asteróide durante uma chuva de meteoros que também destruiu a civilização marciana. Eles implicam que antes disto, Marte e Terra podiam ter sustentado contato por causa do Rosto em Marte. Eles especularam que talvez os marcianos tenham dado sua civilização para a Terra, seguindo o trabalho de Richard Hoagland, um pesquisador inspirado em von Däniken. 

Ainda hoje Hancock é o rei da história alternativa e as teorias dele influenciam a ciência. Hoje em dia alguns estudiosos começaram a acreditar que as Pirâmides representam Orion, e muitos Egiptologistas começaram a examinar o papel de estrelas e alinhamentos estelares na história antiga. Embora isto não seja exclusivamente o resultado dos livros de Hancock, o poder de mercado dele forçou a ciência a reagir e incorporar alguma da evidência dele, junto com a de outros investigadores, no pensamento mainstream. 

Até hoje, foram relacionados muitos monumentos a constelações e imagens de estrelas. Eles incluem os templos de Ankgor Wat (Draco), o Campo de Pirâmide chinês (Gêmeos) e as catedrais de Notre Dame na França (Virgem). 

No fim, o Cthulhu de Lovecraft penetrou na ciência e mudou a forma de conhecimento humano. Mas o outro lado deste quadro é mais negro e perturbador. Essa história origina-se do outro livro de 1976. 

O DÉCIMO SEGUNDO PLANETA

Zecharia Sitchin irrompeu em cena na onda do furor de Däniken. Sitchin acreditava firmemente n a hipótese de intervenção extraterrestre na história antiga e buscou aplicar o conhecimento dele de cuneiformes sumérios e hieróglifos para fornecer evidência para ajustar-se à sua teoria. Interpretando mitos antigos livremente e os combinando com a "prova" de Däniken, Sitchin pôde tecer um conto de deuses astronautas que partem do planeta escondido Niburu ou Marduk (o Décimo segundo Planeta – os outros sendo os nove planetas, o sol e a lua) e chegando na Terra onde eles extraíram ouro para salvar o seu planeta – bem parecido aos Yuggoth de Lovecraft. O planeta, é claro, caiu no sistema solar e através de físicas estranhas criou a Terra esmagando outro planeta no cinturão de asteróides. Isto tudo teria acontecido há aproximadamente 450.000 anos atrás, segundo Sitchin. Ele chamou o líder dos alienígenas Marduk, devido ao deus babilônico; e ele adicionou que os criados daquele Marduk eram os Annunaki, os 50 deuses sem rosto dos Sumérios aos quais Temple comparou à órbita de 50-anos das estrelas Sírio uma ao redor da outra. Os Annunaki farão outro aparecimento antes do fim deste documento. 

Sitchin construiu sobre von Däniken e Velikovsky, acrescentando ao mito um aspecto único. Se extraterrestres deram a civilização ao homem, por que eles não podem ter criado o homem, uma vez que a Bíblia diz que Deus criou o homem a sua pró
pria imagem? Sitchin alegou que fontes sumérias indicam claramente que a expedição para a Terra exigiu que os Annunaki criassem a raça humana e a clonassem em larga escala para fornecer trabalho escravo para suas operações de mineração de ouro – não muito diferente dos Antigos de Lovecraft. Ele continua para dizer que o homem e os deuses têm lutado há milhares de anos, moldando o destino humano. Ele reivindica conhecer a identidade de Yahweh, o Deus hebreu, mas lembra que as pessoas devem comprar seu mais recente livro para conhecer essa revelação. 

Sitchin buscou credibilidade se distanciando do movimento OVNI. Ele disse que havia diferenças claras entre encontros OVNI antigos e os modernos. Ele implicou que os alienígenas modernos são de uma espécie diferente, sem conexões com os deuses antigos. Para ele, os deuses astronautas partiram da Terra e deixaram sua marca em Marte que eles usaram como uma parada de descanso no caminho de volta para o Décimo segundo Planeta. 

Na página 163 de O Décimo segundo Planeta, Sitchin apresenta um desenho feito à mão, sem citação, presumivelmente de um cilindro Sumério com asas encimadas por um pássaro, do qual ele perguntou "O que ou quem era a Águia que levou Etana aos céus distantes? Nós não podemos evitar associar o texto antigo com a mensagem enviada para a Terra em julho de 1969 por Neil Armstrong, comandante da nave Apolo 11: Houston! Base de tranqüilidade falando. A Águia pousou”. Como Paul Hafernik mostra, este argumento é insensato. Nos faz pensar por que estes autores de deuses astronautas são obcecados com foguetes. Afinal de contas, civilizações avançadas deveriam ter ido logicamente além da necessidade por foguetes ineficientes movidos a combustível [químico]. Porém quando estes livros foram escritos, foguetes eram o ápice da tecnologia. 

Até hoje mais de 30 livros por outros autores seguiram a mesma linha da produção prolífica de Sitchin. Mas os fãs de Sitchin são um grupo leal. Quando um dos autores que apóiam a hipótese de Sitchin discordou com ele no ponto do foguete, pedras choveram da comunidade paranormal. Alan F. Alford escreveu para Deuses do Novo Milênio [Gods of the New Millenium] (2000) no qual ele discordou com a reivindicação de Sitchin de que as ressurreições na mitologia se referiam a foguetes levando aliens Annunaki de volta ao seu planeta. No dia 6 de abril de 2000 Alford que chama a si mesmo a voz do bom senso escreveu em seu website que a teoria de Sitchin estava errada: "Eu comecei a perseber (sic) [o erro original é ‘realise’] que os deuses egípcios antigos não eram extraterrestres de carne-e-osso. Pelo contrário, os deuses egípcios eram personificações de poderes celestiais." Leitores protestaram às centenas e Sitchin exigiu que Alford não criticasse mais sua teoria. Longe do debate de mente aberta que os autores alternativos supostamente encorajam, esta dissensão incitou uma tremenda revolta ortodoxa contra o herege. 

Mas Sitchin escreveu muitos (muitos, muitos, muitos) outros livros, e a filosofia dele influenciaria muitos autores por vir. Por exemplo, David Childress escreveu um livro sobre alta tecnologia antiga (inclusive bombas atômicas) intitulado, muito propriamente, Tecnologia dos Deuses (2000). Porém, o impacto mais duradouro de Sitchin adentra no reino da religião. 

Sir Laurence Gardner é o historiador oficial para a Casa dos Stewart, e ele localizou a linhagem dos Stewart de volta às crianças presumidas de Cristo em seu best-seller Linhagem de sangue do Cálice Sagrado [Bloodline of the Holy Grail] (1996) no qual, incidentalmente, ele identificou as catedrais de Notre Dame com Virgem. No livro novo dele a Gênese dos Reis do Cálice [Genesis of the Grail Kings] (2000), Gardner argumenta que os Stewart descendem, através de Cristo, e têm suas últimas origens na linhagem de Davi, Rei de Israel. Davi, por sua parte, descendeu de uma linhagem de reis Sumérios cuja religião politeísta se transformou no Judaísmo. Gardner acredita que a linhagem Davídica recebeu seu direito divino para reger devido à cegada dos Annunaki, pelos quais ele adota a identificação de Sitchin com aliens. 

Em uma nota mais obscura, tanto o Mistério de Sírio de Temple e o Décimo segundo Planeta de Sitchin foram adotados avidamente por cultos OVNI que buscam fornecer um fundo mítico e histórico para sua fé Nova Era de que alienígenas benfeitores salvarão os eleitos na Terra em uma astronave. Em 1998 o culto Heaven’s Gate cometeu suicidio em massa enquanto esperavam que uma astronave logo atrás do cometa Hale-Bopp recebesse suas almas para transportá-las a um planeta Plutão oco, que Lovecraft chamou de Yuggoth, a casa dos Antigos alienígenas. 

Em uma veia semelhante, Claude Vorhillon afirma que no dia 13 de dezembro de 1973 ele contatou um OVNI pilotado pelo Elohim (identificado com os Annunaki) e recebeu uma revelação sobre humanidade. Em uma revelação muito parecida com a Cientologia de Hubbard para ser coincidência, ele soube que o homem era o produto geneticamente criado de experimentação alienígena. Vorhillon mudou o nome dele então para Raël e batizou sua fé nova de Revolução Raëliana. A igreja dele alega ter 55,000 membros em 84 países. 

Raël reivindica que o Elohim (Annunaki) lhe falou em 1973, "Nós éramos aqueles que fizeram toda a vida na Terra, você nos confundiu com deuses; nós estávamos na origem de suas religiões principais”.

À primeira vista pareceria que esta fé é independente de Sitchin porque foi fundada antes de Décimo segundo Planeta debutar. Porém, uma leitura mais íntima da literatura Raëliana mostra que o primeiro livro Raëliano não foi publicado antes de 1976, o ano dos livros de Temple e Sitchin; e o culto decolou no começo dos anos 80. Só então os Raelianos começam a acrescentar engenharia genética às suas doutrinas de fé. Desta forma, aparentemente a crença Raël era originalmente um culto UFO/von Däniken que assumiu as decorações genéticas e Annunaki (Elohim) depois que Sitchin e Temple fizeram suas "descobertas". Sitchin é citado no website Raëliano. Até mesmo se Raël chegou às idéias dele em 1973, ele poderia tê-las obtido de sugestões nos trabalhos anteriores de Däniken que Sitchin desenvolveu em suas teorias. Em resumo, as crenças Raëlianas se originam claramente do movimento de deuses astronautas dos anos sessenta combinado com o movimento OVNI simultâneo. 

Embora a Revolução Raëliana pareça uma crença inofensiva, há uma questão séria envolvida. Uma vez que os Raelianos acreditam que extraterrestres criaram o homem por engenharia genética e clonagem, eles acreditam que é o dever religioso deles clonar seres humanos. Os Raëlianos estão no processo de clonar uma criança suíça de 10 meses cuja morte trágica deixou seus pais de coração partido. Uma professora na Faculdade de Hamilton em Hamilton, NY que é membro da Revolução Raëliana disse em março de 2001 que o projeto de clonagem Raëliana estava quase completo e o clone seria implantado dentro do mesmo mês. Eticistas elevaram objeções imediatamente à clonagem, citando a taxa de fracasso alta e considerações morais. A professora Brigitte Boisselier deixou seu cargo em Hamilton em abril para buscar exclusivamente a clonagem, mas fechou seu laboratório de clonagem no dia 30 de junho enquanto um júri federal investigava o empreendimento de clonagem. Nenhum clone conhecido foi produzido. 

CONCLUSÃO

Assim nós vimos como o mundo fictício de H.P. Lovecraft
deu origem a arqueologia alternativa, deuses astronautas e religiões novas. Nós também vimos que cada um destes fenômenos produziu conseqüências imprevistas que afetam a vida contemporânea. Da egiptologia à clonagem humana, o Grande Cthulhu ainda persegue as perspectivas da mente humana, mesmo que tenha desaparecido da visão direta e tente se mostrar com o disfarce de ciência. O que começou como ficção se tornou nas mentes de muitos fato inegável, com conseqüências muito além dos horrores da ficção de Lovecraft.

***

(c) Copyright Jason Colavito

8 comentários sobre “De Cthulhu à Clonagem

  1. É muito claro que a ficção influencia nosso modo de ver a humanidade, mais para acabar com Sitchin é muito simples, basta trazer a publico uma unica prova de que ele tenha traduzido qualquer que seja a inscrição suméria de forma incorreta, uma unica prova basta, não me refiro a suas interpretações, isso é particular de cada um, me refiro a tradução.
    Diferente dos demais, Sitchin é um dos poucos que conseguem ler as escritas sumericas e também lê o hebraico antigo, e nunca houve nenhuma contestação quanto a suas traduções, a forma que ele interpreta, na realidade pouco importa, é pessoal dele, se ele vende mais ou menos livros também não importa(vamos então contestar o Paulo Coelho que vende muito mais que ele), importa sim a tradução sobre os artefatos, que é incontestável, ou seja, os sumerios acreditavam nisso, e isso já prova a crença(que comprova o culto a seres alienígenas no passado), não que tenha realmente ocorrido, mais prova que a crença deles era esta, quanto a isso não existe contestação, portanto, tem fundamento, e em função disto, merece uma analise séria.

  2. Não concordo que a idéia de deuses astronautas tenha começado com Call of Cthulhu de Lovecraft, afinal os textos antigos já exibiam essa noção em seus mitos de origem onde “seres ou homens fundadores da civilização e criadores do homem que vinham claramente de algumas constelações”. Foi no final do sec. XVIII e em todo o sec. XIX que a europa começou a conhecer as traduões dos mitos orientais de criação, Lovecraft só ligou os pontos para transferir essa ideia para visão moderna sobre o conceito de alienígenas, assim como fez daniken e tantos outros. Lovecraft também tomou emprestados vários conceitos do espiritualismo experimental do sec XIX, experiencias feitas por grandes cientistas da época. Assim, é na verdade a ficção que imitou a vida neste caso.
    Também não concordo com a idéia de que as hipóteses dos antigos astronautas sejam uma ressignificação dos “arquetipos religiosos”???!!! Que o Darwinismo seja uma religião de facto é bem claro, mas ele não impos uma cisão na lógica do pensamento transcendental do sagrado, este é um erro grotesco. Evolução e Cristianismo, ambos sao mitos de criação supervalorizados pelo ocidente e que ainda estao de mãos dadas no limbo da metafisica, a teoria dos deuses astronautas é uma proposição extremamente materialista, mecanicista e positivista que ameaça tanto o darwinismo (pois é uma teoria criacionista científica) como a religião (pois oferece um aporte explivativo suficiente do naturalismo metodologico)
    Assim, este artigo é interessante, mas perde-se em sentido na sua falta de profundidade.

  3. Interessante o texto, tanto para os detratores das “neoteoriasreligiocientificas” quanto para os “neocrentes” pois facilita a pesquisa dos autores que estão todos citados, como um index. Os comentários anteriores são também muito coerentes e demonstra um interesse muito autentico daqueles que o leêm.
    Difícil chegar a uma conclusão de qual lado se encontra a verdada. A muita coisa que a humanidade ainda não pode decifrar, apesar de toda sua ciência. Ainda sinto o que os homens dos séculos muito anteriores sentiam, que nem tudo pode ser explicado (ou provado) por outros homens, por mais letrados que eles pensem ser.

  4. O texto fala que o primeiro livro Raëliano não foi publicado antes de 1976. Eu tenho uma versão original (em francês) de 1974.

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