Pareidolia e os Marcianos

por Andréia Tschiedel, publicado no newsletter BURNetim

Pareidolia é um tipo de ilusão que consiste em reconhecer pessoas ou objetos em estímulos vagos ou caóticos. Como exemplo podemos citar aquelas figuras em nuvens que víamos fácil, fácil, quando éramos crianças, o rosto em Marte, o coelho (ou homem) na Lua, o rosto no Pão de Açúcar. Diversos acidentes geográficos tem seu nome devido ao fato das pessoas associarem suas formas a de algo conhecido. Assim temos o Pedra do Lagarto, a Ilha do Navio e a Baia da Meia-Lua e por aí vai. Existe até um teste muito conhecido, o de Rorschach, onde manchas de tinta devem ser interpretadas. Outro exemplo disso foram os rostos e figuras vistos na fumaça do Word Trade Center e que até foram interpretadas e repassadas Internet afora como sinal do sobrenatural. 

Portanto, ver figuras conhecidas ou que lembre algo onde nada há, é normal para o ser humano. Encontrar um acidente geográfico em Marte que se pareça com um rosto humano é algo que pode ser explicado como algo até natural.

O que não me parece natural, nem lógico, é a insistência em afirmar que tal rosto é uma construção alien depois de tantas provas em contrário e com apenas duas fotos para se embasar. 

A Face de Marte foi descoberta por acaso no meio de diversas fotos que foram enviadas pela sonda Viking, em 1976. Repito, a Face só apareceu em duas fotos e, em ambas, o ângulo da foto foi o mesmo; houve apenas uma pequena modificação da inclinação da luz solar. Foi classificada como um jogo de luzes e sombras pela NASA. Algumas pessoas consideraram esta explicação uma manobra de encobrimento. Após tratamento digital das imagens afirmaram que a Face era a escultura de um ser humano, localizado junto de uma cidade cujos templos e muralhas podiam também ser vistas.

Em cima de 2 fotos, criou-se toda uma civilização marciana. Devido a algumas interferências no envio dos dados digitais, havia pequenos pontos negros numa das fotos, que foram prontamente identificados como dentes. Além de ser comparada à Esfinge egípcia, a Face foi dotada até de dentadura. 

Até por causa da polêmica que tal imagem causou, a NASA programou a sonda Mars Global Surveyor para fotografar, novamente, essa mesma região e com 10 vezes mais nitidez que a Viking. Os primeiros resultados (1998) foram ansiosamente esperados. E, diante de uma formação completamente diferente da que foi divulgada antes – uma montanha corroída pelos fortes ventos marcianos… e nenhuma face, os defensores das conspirações não se detiveram: os americanos tinham ido a Marte e destruído a Face para que ninguém soubesse que existira vida por lá. Este ano, novas fotografias da mesma região confirmaram a inexistência de obra artificial no local. E, novamente, vozes se levantaram para dizer que era montagem ou que a Face havia sido destruída. Mas onde está a lógica de tudo isso?

Se os americanos tivessem tecnologia para ir a Marte destruir uma edificação, porque ainda estariam gastando rios de dinheiro com engenhocas obsoletas tipo sondas, ônibus e estações espaciais? 

Se eles queriam encobrir uma formação que só eles podem fotografar, precisavam destruí-la? E para que encobrir algo que só eles tem acesso?

O fim da corrida espacial terminou gerando falta de verbas e pessoal na NASA. Ela seria a maior beneficiada pela divulgação da existência de um artefato alienígena em Marte. Choveria dotações para se ir até lá e pesquisar o fato.

Ou será que não se está se apegando demais a uma idéia? Não seria a primeira vez em em relação a este planeta. No final do século XIX tinha-se como certo que Marte era o lar de uma civilização muito mais avançada que a nossa, lutando bravamente pela sua sobrevivência num planeta onde havia severas mudanças climáticas e escassez de água. Tudo isso começou quando o astrônomo italiano Giovanni Schiaparelli (1835-1910) notou, ao telescópio, uma série de linhas finas. Estas uniam áreas escuras na superfície do planeta, como canais naturais que unem regiões alagadas. Schiaparelli as chamou de canali. Traduziram o termo para o inglês como channel – canal artificial. Os Canais de Marte foram uma "realidade" por muitos anos, até que, com o aperfeiçoamento dos instrumentos óticos e o envio de sondas espaciais ao planeta vermelho, descobriu-se que eles simplesmente nunca existiram. 

A interpretação errônea de dados observados, aliada ao forte desejo de encontrarmos vida inteligente, tinham criado os canais e seus construtores. 

Será que a Face e Cydonia não é um caso análogo?

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