O Universo Infinito da Mente
- por Paul B. Thompson, editor Nebula
- Muitos anos antes das palavras "discos voadores" ou "OVNIs" serem criadas, já existia um corpo extenso de literatura sobre o contato entre humanos e seres não-humanos. No século XIX, espiritualistas preencheram volumes com discursos obtusos e vagos supostamente obtidos dos espíritos dos mortos. (Por que grandes pensadores, de César a Shakespeare, tornaram-se subitamente idiotas estúpidos e sentimentais depois que morreram é um mistério que os espiritualistas nunca responderam.) Alguns médiuns foram ainda além e contataram psiquicamente os habitantes de outros mundos. Uma mulher suíça conhecida como Helene Smith (nome verdadeiro Catherine Elise Muller) visitou Marte por volta de 1890, encontrou-se com um marciano importante chamado Astane e aprendeu a escrever e falar o idioma "marciano". Um médium de New England chamado Denton visitou a maioria dos planetas conhecidos no sistema solar, descrevendo para seus conhecidos como era a vida em Júpiter, Vênus e Saturno. Em torno de 1880 um dentista de Newburgh, Nova Iorque, chamado John Ballou Newbrough canalizou uma "nova Bíblia" chamada Oahspe, ditada a ele por presenças angelicais em uma novíssima invenção, a máquina de escrever. Oahspe marcou padrões novos para a baboseira oculta, já que estava cheio de excêntricas crenças paranormais: continentes perdidos, anjos que copulavam com animais, seres do espaço e uma "história" racista que explicou por que os caucasianos eram superiores às raças de pele escura (os caucasianos têm mais sangue angelical, de acordo com Newbrough).
Por volta dos anos trinta, uma "bíblia" mais sofisticada estava sendo transmitida à humanidade na forma do Livro de Urantia. Relatos diferentes existem sobre a origem deste tomo volumoso, mas a história básica é parecida com a de Newbrough: entidades não-humanas ditaram o Livro de Urantia a um receptor humano. Seu conteúdo é de um tipo relacionado a outros temas canalizados: muita religião, filosofia, guias sobre como pensar corretamente, nutrição, etc. Pessoalmente eu sempre quis saber por que nossos Irmãos/Anjos Espaciais incrivelmente sábios não relatam temas realmente importantes a nós, como a cura do câncer ou como realizar viagens espaciais sem foguetes dispendiosos e barulhentos.
Começando em 1965, os investigadores de OVNIs na Espanha e França receberam contatos de pessoas que alegavam ser extraterrestres do planeta Ummo, que supostamente orbita a estrela que os astrônomos conhecem por Wolf 424. Estes contatos tomaram a forma de telefonemas (!) e manuscritos de considerável tamanho e complexidade, alegadamente descrevendo a ciência, política e sociologia dos Ummitas. Foram deixados artefatos de Ummo para os investigadores — metal, folhas de plástico — os quais quando analisados provaram ser avançados polímeros ou materiais compostos disponíveis, mas não comuns, na Terra.
O caso Ummo cresceu com o tempo à medida que mais pessoas caíram na rede de contatos feita pelos alegados alienígenas. Uma literatura extensa se ergueu relacionando a sabedoria dos Ummitas, que até hoje é discutida amplamente na Europa continental. Histórias estranhas e complicadas de fraude e mentiras também foram incorporadas à lenda Ummo. Ufólogos americanos e britânicos geralmente consideram o caso Ummo como uma fraude elaborada, talvez uma experiência social perpetrada por alguma agência de inteligência (escolha seu candidato favorito–a KGB, a Stasi da Alemanha Oriental, a CIA, a inteligência militar francesa…). Investigadores franceses e espanhóis que se aprofundaram no folclore Ummo durante décadas não estão tão seguros. Quem poderia, ou iria perpetrar tal fraude complexa? Há centenas de páginas de documentos dos alegados alienígenas, alguns dos quais detalham o sistema matemático de Ummo. Isto não é como as escritas confusas, intelectualmente evanescentes achadas em Oahspe ou no Livro de Urantia. O material Ummo não está além da mentalidade dos seres humanos, mas de fato levanta uma pergunta séria: quem escreveria tais tratados longos, e por quê?
Eu não estou em posição para prover uma resposta exata, mas na tradição de UFO Cautionary Tales prévias, eu posso sugerir um fenômeno paralelo que pode fornecer pelo menos parte da resposta. Ela envolve uma característica humana subestimada, a mente.
O Divã a Jato
O dr. Robert Lindner (1914-1955) nasceu na cidade de Nova Iorque. Quando criança sua paixão era a ficção científica, que naqueles dias significava H. G. Wells, "Tom Swift" e revistas populares como Histórias Maravilhosas (Amazing Stories). Lindner recebeu seu Ph.D. em psicologia em Cornell em 1938. Ele seguiu para uma carreira curta mas intensa como analista Freudiano e escreveu vários livros recordando suas experiências. O primeiro livro dele, publicado em 1944, era "Rebeldes Sem Causa" que deu seu título a nada menos que o famoso filme de James Dean. O mais longo trabalho do dr. Lindner foi seu estudo de 1955 chamado "A Hora de Cinqüenta Minutos" (The Fifty Minute Hour), uma coleção de cinco casos psicanalíticos. Lindner escreveu com o poder e a claridade de um novelista; de fato, para proteger a identidade de seus pacientes ele inventou certos aspectos das vidas deles.
O quinto e último caso em "A Hora de Cinqüenta Minutos" chama-se "O divã a jato" (The Jet-Propelled Couch). O dr. Lindner recebeu uma chamada de um médico "em uma instalação do governo no Sudoeste". Um dos cientistas (Lindner diz ser um físico) no laboratório do governo estava exibindo sinais de psicose, alegando ser de outro planeta. Lindner atribuiu a este homem o pseudônimo de "Kirk Allen". Um dos supervisores de Allen no laboratório do governo notou que ele estava escrevendo páginas e páginas de hieroglifos. Quando perguntado sobre os símbolos estranhos, Allen se desculpou e prometeu gastar mais tempo neste planeta, i.e., a Terra!
Por causa da natureza sensível do trabalho deste cientista para o governo norte-americano, pediram que o Dr. Lindner tratasse este físico o mais cedo possível. Allen foi enviado para Baltimore onde o dr. Lindner trabalhava. Ele estava então em seus trinta anos, loiro e dado a usar ternos de tecido grosso e chapéus do Panamá. Lindner logo descobriu que Allen tinha nascido no Havaí em 1918, filho de um oficial naval americano, e passou boa parte de sua infância na Polinésia. Os problemas de Allen começaram quando ele foi deixado aos cuidados de uma governanta, uma estranha mulher ninfomaníaca que o seduziu quando ele tinha apenas onze anos. Lindner parte para uma análise Freudiana clássica da formulação sexual de Allen, os medos dele de incesto materno, etc. Allen se identificou fortemente com as pessoas polinésias ao seu redor e achou o comportamento das pessoas brancas que ele conheceu alienadoras. Um pouco mais velho ele encontrou os romances de (como Lindner diz) "um escritor altamente imaginativo e prolífico… um autor inglês famoso", e Allen sentiu um choque de "reconhecimento" com o fato do herói dos romances ter o mesmo nome dele.
(Isto sugere os romances de aventura marciana de Edgar Rice Burroughs. O herói dos romances marcianos de Burroughs chamava-se John Carter. Havia um físico em Los Alamos ou White Sands em finais dos anos 40 chamado John Carter? Eu não sei. Lindner ficcionaliza livremente
detalhes de seus casos, tornando a identificação dos pacientes problemática.)
Com o passar do tempo, os problemas psicológicos de Kirk Allen tomaram a forma de fazê-lo acreditar que era um extraterrestre, temporariamente preso no disfarce de um terráqueo ordinário. Usando os romances que leu como um ponto de partida, ele começou a compilar listas de planetas que tinha visitado, completas com detalhes de sua geografia, flora e fauna, civilizações e políticas. Isto começou em sua adolescência e continuou até seus trinta anos. Não pareceu interferir com sua educação na faculdade ou na carreira subseqüente como físico. Mas por volta dos trinta anos, o conhecimento "alien" acumulado de Allen começou a se sobrepor sobre os detalhes mundanos de sua vida real, e os colegas dele reconheceram as profundidades de suas ilusões pela primeira vez.
" Kirk Allen " não era apenas algum valentão de Burroughsiano — ele era, na mente dele, o imperador de um vasto reino galáctico. Ele viajou pelo cosmo inspecionando seus mundos conquistados, e registrou seus achados com detalhes meticulosos. Por causa de seu treinamento em matemática e ciência, os mundos fantasmas de Allen eram muito mais mais completamente concatenados que qualquer ficção científica ordinária, e anos-luz mais sofisticados que qualquer coisa achada em Oahspe, Urantia, ou os documentos Ummo. Quando o Kirk Allen " descobria " um planeta, ele calculava sua mecânicas orbital com a precisão de, bem, um físico da Ivy League. Uma vez que o Dr. Lindner obteve a confiança de Allen, lhe foi mostrada a seguinte documentação do cosmos de Kirk Allen:
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Uma autobiografia de Allen, com 12.000 páginas, em 200 capítulos. Anexado a ela estavam 2.000 páginas adicionais de notas e anotações. Muitas destas notas foram escritas em uma taquigrafia que o próprio Allen havia inventado.
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Um glossário de nomes e termos, com mais de 100 páginas.
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82 mapas, desenhadas em escala a cores, consistindo em 23 mapas planetários em quatro projeções, 31 continentes nestes planetas, o resto consistindo de mapas de cidades nesses planetas.
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161 desenhos arquitetônicos, em escala e extensivamente anotados, alguns em cores.
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12 tabelas genealógicas.
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18 páginas descrevendo a galáxia na qual o Kirk Allen morou, com quatro quadros astronômicos, e nove mapas estelares.
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Uma história de 200 páginas do império regido por Kirk Allen, com 3 páginas de eventos históricos importantes, batalhas, etc.
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44 pastas de papéis arquivados que contêm até 20 páginas cada de memorandos sobre os planetas diferentes que Kirk Allen regeu ou visitou. Estes tinham títulos como "A Metabiologia dos Moradores de Vale", " O Sistema de Transporte de Seraneb", "A Aplicação de Teoria de Campo Unificada e as Mecânicas do Motor Estelar para Viagem Espacial", "Estudos Antropológicos em Srom Olma I", "Biologia de Plantas e Ciência Genética de Srom Olma I" e muito mais.
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306 desenhos, alguns pintados, de máquinas extraterrestres, animais, roupa, instrumentos, pessoas, plantas, insetos, armas, veículos, edifícios, até mobília.
- Quão pálido e superficial deve ser comparada a sabedoria Ummo às ilusões de um único terráqueo educado!
- O Dr. Lindner foi quase subjugado pelo volume imenso das ilusões de Allen. Ele submeteu Allen a testes físicos e neurológicos extensos, dos quais todos resultaram normais. O problema de Allen era completamente mental, e ele desenvolveu teorias curiosamente familiares para responder pela presença dele na Terra. Um leitor dos trabalhos de Charles Fort, Allen decidiu que tinha sido teleportado para a Terra, e que órgãos "psíquicos" indefinidos em seu corpo lhe permitiram retornar (pelo menos astralmente) para sua galáxia de origem sempre que ele desejava. Em outro contexto Kirk Allen poderia ter se tornado um contatado de OVNIs famoso, o fundador de um culto, ou pelo menos o centro de uma grande controvérsia. Imagine, físico do governo, graduado na Ivy League, o extraterrestre entre nós–que tipo de impacto teria tido Kirk Allen se ele houvesse chegado à atenção de um público crédulo em vez do Dr. Lindner?
A psicanálise de Lindner de Kirk Allen tomou a forma de passar pelas miríades de detalhes em sua ilusão, enquanto procurava por inconsistências que poderiam chocar Allen de volta à realidade. Não havia muitas. A galáxia de Allen era medida em unidades chamada "ecapalim", equivalente a uma e cinco dezesseis avos de milhas. Ele produziu cálculos de órbitas e tamanhos planetários nesta bizarra fração, enquanto os convertia a milhas para o benefício do Dr. Lindner.
Eventualmente a tensão de tal escrutínio tirou o escapismo das ilusões de Allen, e elas perderam valor para ele. Ele as abandonou, mas manteve o fingimento para o Dr. Lindner durante algum tempo, só para condescender o terapeuta inquisitivo dele! O fato irônico era que, ao final de seu tratamento, as fantasias de Allen tinham englobado Lindner, um fã de ficção científica há muito tempo. Allen confessou eventualmente que já não acreditava nas próprias ilusões, e que ele só tinha fingido durante semanas para satisfazer o Dr. Lindner.
Kirk Allen estava curado de sua fantasia espacial, e o caso dele ilustra o vasto poder criativo da mente humana de forma claríssima. As pessoas que acreditam em sabedoria canalizada, nas revelações dos Irmãos Espaciais, freqüentemente desafiam os céticos dizendo "Como uma pessoa ordinária poderia inventar tais materiais estranhos? Deve ser verdade — de onde mais tais detalhes poderiam vir?" A verdade é que, como demonstra Kirk Allen, a menos que as revelações alegadas contenham conhecimento totalmente fora do reino de compreensão humano (como, digamos, uma grande inovação na ciência ou medicina), eles só podem vir da mente do revelador. A imaginação humana consiste de espaço infinito, e muitos universos podem existir em um único crânio. Procure as respostas por lá antes de erguer seus olhos para o céu.
Adendo
Há um rumor persistente em círculos de fãs de ficção científica de que "Kirk Allen" era na realidade o Dr. Paul Myron Anthony Linebarger (1913-1966), que escreveu ficção científica sob o pseudônimo de Cordwainer Smith. O Dr. Linebarger era um homem fascinante em seu próprio direito — afilhado do Dr. Sun Yat Sen, pai da República chinesa. Linebarger cresceu na Ásia e recebeu seu Ph.D em ciência política com a idade 23 anos na Johns Hopkins University. (Johns Hopkins está em Baltimore, obviamente onde o Dr. Lindner realizava sua prática). Ele serviu na China como um oficial de inteligência durante a Segunda Guerra Mundial. Depois da guerra ele escreveu um livro didático famoso, Guerra Psicológica, e serviu como coronel no braço de inteligência do Exército norte-americano. Ele aconselhou o Exército britânico durante a supressão dele de nacionalistas malaios, e aconselhou o exército em assuntos de guerra psicolófica durante o conflito coreano. Posteriormente, o Dr. Linebarger recusou empregar sua perícias ao esforço no Vietnã, julgando o envolvimento americano por lá um engano desde o início.
Linebarger começou a escrever ficção científica nos anos trinta, usando uma história futura ricamente detalhada conhecida como "A Instrumentalidade do Gênero Humano". A ficção estranha, etérea dele tem um poder todo próprio. Ele escreveu dois romances populares sob o pseudônimo de "Felix C. Forrest&qu
ot;, e um romance de espionagem como "Carmichael Smith". Tudo estão há muito tempo esgotados, mas sua ficção científica permanece, bem admirada por conhecedores do gênero.
Seria o Dr. Linebarger "Kirk Allen"? Não há nenhuma evidência legítima de que ele era, só suposição intrigante e teoria intrigante.
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Nunca me canso de ler este artigo :)!